
O quintal de Alvarez é constituído por duas parcelas simétricas: a primeira é dedicada à plantação de batatas. São batatas turcas, explica, trazidas pelos avós dos avós dos avós de Alvarez. Tudo no discurso de Alvarez diz respeito aos avós dos avós, e conta mesmo que não havendo memória de mar em Hispéria os bivalves não mentem: a verdade é só uma, em tempos houve mar nesta terra. De seguida conta a história dos primeiros viajantes que aportaram em Hispéria. Por mar, claro está, conta Alvarez. Eram animais pequeninos, soprados por uma vaga fortíssima de leste. Tal como os humanos, partilhavam segredos e anotavam mentalmente as respectivas genealogias, de modo que a ligação entre genealogia e memória começou aí, com esses animais pequeninos. Entretanto muda o sentido do discurso para falar da sua dieta, referindo que leva muito a sério os seus 120 quilos e que todas as manhãs come 5 pães com café. Ou então com leite. A outra parcela do terreno é dedicadas a investigações, e coloca um ar bastante solene quando diz "investigações". Com pás, picaretas e outros instrumentos de perfuração investiga o solo de Hispéria. Coisas muito importantes estão nesta terra, diz de olhos fechados. Nos anos que leva de investigações encontrou 2 latas de atum de uma fábrica entretanto falida chamada "Amor del Atún", uma boneca de porcelana com uma perna partida e um
ramo de oliveira dentro, de olhos pintados a tinta da china e com um lenço na cabeça onde se pode ler "Muñeca Tonta"; encontrou também uma embalagem de lixívia da marca Neoblanc e um saco de lulas podres. Foi muito complicado perceber a que árvore pertenceria o ramo na boneca, e por isso recorri ao senhor Joaquín, especialista em mitologia botânica. Somos assim em Hispéria, mitologistas e viajantes; e alguns viajam no próprio quintal. Estou muito contente com as minhas investigações, é um processo bastante enriquecedor. Alvarez sorri.
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